quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

DEPOIMENTO DO JUMENTO JURASSIC


 
Meu nome é Jurassic. Este nome estranho veio por causa do filho do boiadeiro. Quando nasci, aquele filme, Jurassic Park, fazia o maior sucesso. Então o menino João Paulo não teve dúvida. Assim que me viu, quando ainda tentava me endireitar sobre as patas cambaleantes, disse: “Pai, ele vai se chamar Jurassic!”.
No começo minha vida era muito boa. Dura, é claro, mas boa. Jumento não se queixa de dureza e serviço pesado. Fomos talhados pra isso mesmo. Gostamos de trabalhar com o bicho-homem. Neste grande sertão sem-fim, já fizemos muita coisa juntos.
Porém, tudo começou a piorar quando João Paulo, com seus vinte e poucos anos, meteu-se em um financiamento e apareceu com uma moto. No começo o pai desconfiava da utilidade daquela geringonça barulhenta. Mas o filho insistiu que com ela era mais fácil tocar o gado. Foi que foi que acabou convencendo o velho a abandonar minha mãe na beira da estrada. Dizia que ela empacava demais. Depois foi o meu tio, que já estava um pouco velho. Compraram mais uma moto e aí foi a vez do meu pai. Mais algumas semanas e lá estava eu, no mesmo fim.
Agora, toda a nossa população, lutando para sobreviver e sendo atropelada nas estradas, virou assunto para políticos e autoridades. Tem até um tal promotor que quer matar todos nós para servir de comida para presidiários... Levando em conta que nós, jumentos, sempre fomos fiéis trabalhadores a serviço do homem nordestino... Decisão justa, não? E ainda se consideram seres humanos...