sábado, 26 de dezembro de 2015

É TEMPO DE PENSAR SOBRE O TEMPO

Convido-lhe a fazer uma experiência. A partir de agora, estabelecerei uma conexão direta com o tempo presente. Começará no próximo parágrafo, topas? Vem comigo? Se não quiser, esqueça este texto e continue pulando de galho em galho na árvore "passado-futuro", crucificado entre dois tempos que vivem a nos angustiar. Mas se topar, então vamos lá, somente "aqui-agora". Já!
 
Conjugo todos os verbos no presente do indicativo. Olho somente para o que acontece no instante em que vivo. Não penso no passado, tampouco no futuro. Não associo, percebo as coisas tal como são, pois associações geralmente nos remetem para fora do momento em que estamos.
 
Meus olhos permanecem voltados para a janela. As coisas passam, mas na verdade sou eu que passo pelas coisas. Nada importante acontece. O trem está vazio. Serpente iluminada em meio à noite. Não! Sem associações! Concentro-me nos cinco sentidos. Plataforma da estação Cidade Jardim corre ao meu lado. Fica para trás (...) Desembarque pelo lado esquerdo do trem (...) Atenção! A estação Luz, da CPTM, está interditada (...) Não quero lembrar do incêndio no Museu da Língua Portuguesa. Está no passado. Agora, o passado não existe. Mas lembro. Uma morte. Bombeiro civil (...) Novamente presente. Os sapos coacham na estação Tamanduateí. Sinfonia. Ainda nada importante. O trem chega. Entro. Não quero lembrar de nada. Só observar. Cada um no seu mundo. Ninguém percebe o mundo ao redor. Desço. Saio da estação. Ponto de ônibus. No chão tem uma garrafinha de água mineral e uma lata de coca-cola. Tem também uma pessoa. Dorme ao lado destes dois objetos. As pessoas no ponto não dão importância. São três objetos largados no chão. Chega o ônibus, para, eu entro. Perto do meu ponto de descida, na praça, o motorista conduz o veículo com extrema lentidão, faz a curva muito aberta, em um traçado que não compreendo. Entendo só depois, quando ele fala: "... cachorro folgado... dormindo no meio da rua...". Continua nada importante. Nada importante, mas curioso... Desço do ônibus, ando, chego em casa.
 
Meu tempo presente é este. E o seu? Existe? Você pratica a vivência plena do momento? Exercita os cinco sentidos? Por exemplo, em outro "agora" estou no ônibus fretado... Volta do serviço... Sinto o vento que entra pela janela aberta. Cabeça recostada no encosto da poltrona. Venta só na orelha esquerda. Faz barulho. Outra coisa sem importância. Mas agora é importante. Importante porque é presente. Porque é real.
 
Tenho a impressão que o tempo não existe. Não é bem assim... Sinto-o, sei que ele passa... Mas acho que é uma ilusão. E desconfio que quanto mais nos libertarmos desta ilusão, aplicando concentração total no presente, vivendo-o plenamente, mais nos aproximaremos da verdadeira felicidade que está reservada aos reles mortais. Mortais? (...)
 
Mas você pode achar que isto tudo é uma grande baboseira e que só perdeu "tempo" ao ler este texto... Olha o tempo aqui de novo! Tudo bem... Afinal, cada um lida com o tempo do seu modo, não é mesmo?