Outro
dia fui comprar um remédio pra enxaqueca e não achei em nenhuma farmácia. Bem
que o médico, ao receitar, desconfiou que não mais estivesse disponível. “É um
remédio antigo”, disse ele. Também não encontrei nenhum equivalente. A
substância não é mais fabricada, foi o que sentenciou o rapaz da drogaria, após
consultar aquele livro cheio de nomes de remédios, que lembra as listas
telefônicas de antigamente, só que mais fina.
Este
insucesso me fez pensar uma série de coisas...
As
listas telefônicas, tudo bem, não há problema algum que não sejam mais
fabricadas, mas este remédio, a minha esposa fez uma pesquisa na internet,
encontrou vários comentários de pessoas se queixando que este era o único
remédio que funcionava, que os outros que vieram depois não resolvem como o
antigo medicamento.
Tem
um remédio que funciona? Então vamos tirá-lo de circulação. Não pode ser cem
por cento. É preciso manter uma dose, um índice de doença latente na população.
Porque assim o sujeito vai consumir mais drogas, outros medicamentos, vai
trocar as substâncias, as mais novas sempre mais caras.
Este
novo produto não pode durar muito. Temos que dar um jeito de fazê-lo quebrar
logo após o término da garantia. Porque assim o consumidor vai comprar outro,
gerando mais lucro para a empresa.
Já
ouviu dizer que o câncer tem cura? Já viu notícia de carro movido a água? Será
que são mentiras? Por que estas coisas surgem e logo desaparecem, sem ganharem
a repercussão e atenção que merecem?
Até
que ponto o dinheiro e o interesse lucrativo de certos mercados vão dar as
cartas no jogo da vida? Quais são os valores que movem as pessoas, as empresas,
a sociedade?
Vamos
cortar funcionários. Quem? Corte aqueles que ganham mais. E assim é feito, sem
a mínima preocupação em saber se este é o critério mais justo.
Já
temos tecnologia para fabricar um aparelho com esta lista completa de recursos,
mas não vamos lançar tudo de uma vez. Criaremos várias versões, uma depois da
outra. Os consumidores vão querer e comprarão todas elas, sedentos pelos
aumentos progressivos de recursos e facilidades.
Os
transgênicos e agrotóxicos na agricultura não são saudáveis? Os antibióticos e
o estresse a que são sujeitos os animais na pecuária e na avicultura prejudicam
a nossa saúde? Que importa, se dão mais lucros?
Acordo
de Paris, para que os países reduzam a produção e uso de energia fóssil e a
troquem por energia limpa? Não! Isso vai prejudicar minhas indústrias!
Nicola
Tesla foi um cientista e inventor incompreendido no seu tempo. Queria inventar
uma fonte de energia gratuita, disponível para qualquer pessoa, obtida por uma
espécie de indução. Não precisa nem dizer que esta ideia humanitária lhe
ocasionou a perda do investimento.
Dizem
que isto tudo faz parte da Lógica Capitalista. Mas eu acho que dá para ser
capitalista sem cometer estes excessos. Sou otimista, acredito que um dia
acertaremos a dose do capitalismo, mas até lá perderemos nossas doses de
remédios. E outras coisas mais...
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