Quando apareceu na TV
alguém falando e, embaixo, algum nome seguido de “aposentado”, minha esposa
disse, meio que perguntando: “Então agora, quando for preencher alguma ficha,
tenho que colocar ‘aposentada’?”.
Respondi que sim.
Acrescentei que a aposentadoria nivela todo mundo, por baixo. O cara pode ter
sido um diretorzão de uma grande empresa... Não importa. Vai ser mais um
aposentado como todos os outros. É lógico, com muito mais mordomia, mas, para
efeito de ficha ou daquela linha de rodapé que se coloca quando o sujeito
aparece na TV, é tudo a mesma coisa: aposentado.
Então pintou aquele sentimento
de desqualificação... Acho que foi por reagir a esta injustiça que me surgiu a
ideia: “Quando eu me aposentar, vou colocar ‘escritor’”, foi o que disse.
Talvez até ela tenha
julgado uma ousadia de minha parte. E com razão, pois onde já se viu um indivíduo
como eu, que não ganha um tostão com literatura, ter a petulância de se autointitular
“escritor”... É, está certo, sob o ponto de vista “econômico”, talvez eu nunca
possa me considerar escritor. Mas nada me impede de, sob a visão “artística”,
usar este título.
Completei e disse o
seguinte pra minha esposa:
– Você também pode mudar!
Põe “psicóloga”!
– Eu coloco “dona de casa”!
– Dona de casa, psicóloga...
Põe psicóloga! É a sua formação! Que problema tem?
Estava instaurada a
insubordinação ao nivelamento por baixo do termo “aposentado”. Foi assim que me
preparei para o tão sonhado futuro alternativo. Na verdade foi mais uma regada
em uma planta programada para crescer depois...
Resta saber se, quando
chegar a hora, a inspiração e o pique vão continuar. Certa vez ouvi dizer que
um certo alguém, acho que já com alguma projeção no meio literário, quando se
aposentou e se viu livre para se dedicar ao seu sonho, eis que, de repente, viu
a inspiração esvair-se e não conseguiu escrever mais nada... Será que isto vai
acontecer comigo?
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