O pior desejo é o desejo morto. Quem tem desejo
morto é Zé. Simplesmente Zé.
Houve tempo em que Zé desejava. Desejava tanto
que se poderia até dizer que Zé “deZéjava”. Ficou engraçado. Mas esta é uma
narrativa triste. Se coloco esta pitada meio cômica, é para amenizar o fardo de
Zé.
Mas, como dizia, houve tempo em que Zé desejava,
e muito. Porém cansou de desejar.
Desejava um bom emprego. No entanto, ao perder o
que tinha, passou a desejar somente ter emprego. Contudo, como não encontrava,
deixou corroer este desejo e lançou-se na luta pela sobrevivência,
contentando-se com bicos esporádicos.
Desejava ter uma boa casa. Mas, quando não mais
conseguiu pagar as prestações, trocou este desejo pelo aluguel, desejando poder
honrar seus compromissos com o locador. Todavia, tal honraria não se fez
possível. E então foi parar debaixo da ponte.
Desejava proporcionar conforto para sua família.
Porém a família desintegrou-se, tão ou mais rapidamente que sua vida... Ficou
só. Este desejo ficou sem endereço, não havia mais família.
Desejos ficaram para trás, cedendo lugar para as
necessidades básicas. Sim, porque necessidades básicas são bem diferentes dos
desejos.
Zé tornou-se algo. Ao revirar o lixo, as pessoas
não distinguiam entre um e outro. Coisificou-se, totalmente ignorado, como algo
que saiu fora da engrenagem econômica, como muitos outros Zés e não Zés...
Dentro de Zé havia muitos desejos. Agora não há
mais nada. Nem identidade, nem sanidade, nem Zé. Somente desejos mortos.
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