Abro o portão. Entro. Caminho pelo quintal
lateral. Do meu lado esquerdo, o canteiro gramado. Folhagens e folhas, todas
bem cuidadas. À frente vejo-os sentados, na lavanderia, tomando o sol da manhã.
Papai, com 95. Mamãe, 92. Uma parte da Dona
Rosália já está no “outro lado”. É assim mesmo. O Alzheimer vai levando aos
poucos. Já com seu Francisco, sua mente está bem mais preservada que a da
esposa, se bem que ele já esqueceu uma porção de coisas...
Resolvo testar:
– Pai, o senhor lembra do Aquarick?
Depois de repetir várias vezes a pergunta, para
driblar a surdez trazida pela idade, acabo constatando que esta é mais uma
lembrança perdida... E olha que procuro outras referências:
– Aquele barco que o senhor inventou? Que foi
feito sobre o chassi de um Maverick, com tambores para flutuação? Um anfíbio,
que andava na água e na terra, para resgatar as vítimas da enchente? Lembra que
o senhor fez um teste na represa?
Nada.
É um tanto frustrante... Ele, que inventou
tantas coisas na vida, de vez em quando se perde na própria casa, não encontra
o banheiro, o quarto...
Baixo os olhos. Ao levantá-los, miro o rosto de
minha mãe. Está tranquila. Sorrio para ela. E ela me retribui com um lindo
sorriso, que faz tudo ter sentido. Mesmo que ela não se lembre mais de mim.
Mesmo que o meu pai não se lembre mais do Aquarick e nem de todas as suas
outras maravilhosas invenções...
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