Está chovendo.
Incontáveis corpos molhados cobrem a avenida nos primeiros minutos de corrida.
Ele está no meio do
pelotão geral, com o número 3636 na camiseta. De repente começa a correr mais
que todos ao seu lado. Caça espaços vazios no mar de gente, que o olha com
pensamento único: “Esse aí quer chegar lá na frente para ter o seu momento de
glória... Vai se matar para conseguir ficar alguns instantes entre as estrelas,
torcer para que a TV capte sua imagem, para depois largar a prova, exausto”.
Depois de poucos minutos
já alcança o primeiro pelotão. Corre. Terceiro lugar! Corre. Segundo!! Corre.
Primeiro!!!
Narradores e
comentaristas esportivos explicam para os telespectadores que se trata,
simplesmente, de um oportunista que quer aparecer. Mas depois, ao verem que,
por quinze minutos, o sujeito consegue não só manter a dianteira, como ainda
vai aumentando a distância para o segundo colocado, aí então os especialistas
já não sabem mais o que dizer.
O fim da prova se
aproxima. O do misterioso corredor também...
Todos sabem o que lhe
aconteceu. Afinal, a imagem do seu corpo caindo, logo após cruzar a linha de
chegada em primeiro lugar, foi exaustivamente repetida nos últimos dias... Não
espere você, leitor, que eu vá aqui revelar alguma informação deste
incompreensível acontecimento, do qual ninguém sabe absolutamente nada.
Eu também nada sei...
Muitas coisas foram ditas. Disseram até que ele era um extraterrestre, e que
seu corpo está sendo esquadrinhado pelos cientistas... Onde há escassez de
dados, campeia a fantasia...
Todo mundo, de uma
maneira ou de outra, impressionou-se com esta fantástica e inexplicável
ocorrência. E cada um reage a seu modo. Eu quis fazer este texto, esta é a
minha reação. E não quero saber de respostas. De onde ele veio, o que ele
queria, como ele conseguiu... Nada disto importa. Mesmo porque ninguém foi
capaz de responder a nenhuma destas ou outras perguntas.
Ele só queria correr. Só
isso.
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