segunda-feira, 27 de maio de 2019

O PALÁCIO DA MEMÓRIA

Rimeda esquece muito as coisas. A esposa cobra, fica brava. Ele se incomoda com o problema.
Fica sabendo da técnica “Palácio da Memória”. Aprofunda-se no estudo da mesma e resolve aplicá-la.
Para cada coisa que deseja memorizar, imagina seu Palácio Mental, e nele guarda o que não quer esquecer.
Conquista uma memória primorosa. Resolve aproveitar melhor a incrível capacidade, que aumenta a cada dia. Estuda, presta concurso público, passa, salário de marajá, padrão de vida invejável.
O tempo passa e Rimeda percebe os primeiros sinais de descontrole. Sua mente não para de armazenar. Acordado ou dormindo, o palácio acumula informações. Demais, desnecessárias... Tudo é guardado, automaticamente. Não consegue parar.
A situação fica insuportável, psicológica e emocionalmente...
Até que tem uma ideia e nela deposita todas as esperanças. Tarde de sábado, sozinho em casa, larga-se na cama, entra no palácio mental, reserva um novo quarto, para guardar somente as coisas mais importantes... E coloca fogo em todo o resto! O processo dura horas, consome muita energia, pois ele desgasta-se muito tentando proteger o único quarto que não pode queimar. Em transe, perde a noção do tempo. Depois cai em sono profundo e segue dormindo até o dia seguinte.
Logo pela manhã, a esposa pergunta:
– Sabe que dia é hoje? – Questiona por força do hábito, pois, com certeza, ele sabe, agora não esquece mais nada. Ainda mais se tratando do aniversário de casamento...
Rimeda ficou muito contente e aliviado ao constatar que não se lembrou da importante data.

sexta-feira, 3 de maio de 2019

DONA TERRA

Estava cansado. Gasto de tanta notícia ruim. Rompimento de barragem, Brumadinho, Mariana, pacote do veneno, agrotóxicos, aquecimento global, golpe, ditadura, militares, exploração desenfreada...
Desconectei-me de todas as mídias possíveis e fui ao encontro do meu filho de cinco anos, que havia acabado de deitar e que já reclamava, querendo uma estória para dormir.
Respirei fundo e comecei:
– Era uma vez um menino que cresceu tanto, mas tanto mesmo, que ficou do tamanho do planeta Terra...
Olhei para o seu rostinho e, onde esperava encontrar uma interrogação, notei sua curiosidade e expectativa. Os desenhos animados já o haviam preparado para entender este começo de história um tanto fora dos padrões. Assim sendo pude continuar:
– Então ele olhou para a Terra e perguntou: “Por que você está tão triste?”. Ela, com sua enorme cara redonda, respondeu: “Porque o homem está destruindo meus rios e oceanos, envenenando as plantas, acabando com os animais...”.
Silêncio. Não sabia mais como prosseguir.
Meu pequenino percebeu o impasse e atravessou: “Posso continuar, papai?”. Prontamente aceitei, contente. E sua doce vozinha me socorreu:
– Aí a Dona Terra falou assim: “Quer saber de uma coisa? Vou viajar pelo Espaço, até chegar bem perto de um planeta com bastante vulcão e dinossauro... Aí então toda gente ruim vai ter que nascer nesse outro planeta. Só vou deixar nascer gente boa em mim!”.
Seu sorriso infantil coroou este desfecho.
Fiquei perplexo, a pensar: “Seria bom que tudo fosse tão simples assim! E talvez até seja...”.