sábado, 26 de julho de 2014

APOSENTADO OU ESCRITOR?


Quando apareceu na TV alguém falando e, embaixo, algum nome seguido de “aposentado”, minha esposa disse, meio que perguntando: “Então agora, quando for preencher alguma ficha, tenho que colocar ‘aposentada’?”.

Respondi que sim. Acrescentei que a aposentadoria nivela todo mundo, por baixo. O cara pode ter sido um diretorzão de uma grande empresa... Não importa. Vai ser mais um aposentado como todos os outros. É lógico, com muito mais mordomia, mas, para efeito de ficha ou daquela linha de rodapé que se coloca quando o sujeito aparece na TV, é tudo a mesma coisa: aposentado.

Então pintou aquele sentimento de desqualificação... Acho que foi por reagir a esta injustiça que me surgiu a ideia: “Quando eu me aposentar, vou colocar ‘escritor’”, foi o que disse.

Talvez até ela tenha julgado uma ousadia de minha parte. E com razão, pois onde já se viu um indivíduo como eu, que não ganha um tostão com literatura, ter a petulância de se autointitular “escritor”... É, está certo, sob o ponto de vista “econômico”, talvez eu nunca possa me considerar escritor. Mas nada me impede de, sob a visão “artística”, usar este título.

Completei e disse o seguinte pra minha esposa:

– Você também pode mudar! Põe “psicóloga”!

– Eu coloco “dona de casa”!

– Dona de casa, psicóloga... Põe psicóloga! É a sua formação! Que problema tem?

Estava instaurada a insubordinação ao nivelamento por baixo do termo “aposentado”. Foi assim que me preparei para o tão sonhado futuro alternativo. Na verdade foi mais uma regada em uma planta programada para crescer depois...

Resta saber se, quando chegar a hora, a inspiração e o pique vão continuar. Certa vez ouvi dizer que um certo alguém, acho que já com alguma projeção no meio literário, quando se aposentou e se viu livre para se dedicar ao seu sonho, eis que, de repente, viu a inspiração esvair-se e não conseguiu escrever mais nada... Será que isto vai acontecer comigo?

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