Um dia desses recebi uma corrente de WhatsApp
que mexeu comigo e que está me motivando a escrever estas linhas. Ninguém é
dono da verdade, mas a verdade não deve ser deturpada ou completamente negada
para atender a determinados interesses, nestes casos, sempre sombrios
interesses.
Explico melhor, para que o leitor possa entender
o que estou querendo dizer. Primeiramente devo mencionar que a mensagem
recebida tinha cerca de 80% do texto com conceitos aderentes ao meu pensamento,
e creio que também condizentes ao senso comum, sem ferir a verdade, pois falava
sobre todas as coisas que as crianças devem aprender em casa. Boas maneiras,
honestidade, solidariedade, respeito, cooperação, etc. Ninguém, em sã
consciência, pode ser contrário a estes princípios. Até aí, tudo bem. Na
sequência, o texto prossegue, listando o que os professores devem ensinar na
escola, enumerando todas as matérias que conhecemos: Matemática, Português,
História, Geografia, Ciências, etc. E, para completar a primeira parte,
mencionava que os professores “apenas reforçam o que o aluno aprendeu EM CASA!!!”.
Estava escrito exatamente assim como aqui coloquei, com todas as letras maiúsculas
e exclamações. Outra vez, até aí, tudo bem. Isto porque não há como negar que
todo o aprendizado dos princípios acima descritos deve acontecer,
prioritariamente, em casa, e que a tarefa da escola é, apenas, reforçar tais princípios
civilizatórios.
Mas os 20% finais do texto me deixou de queixo
caído. Não acreditava no que estava lendo. Transcrevo, abaixo, a parte mais
impactante:
“NA ESCOLA
NÃO se aprende sobre:
1 – Sexo
2 –
Ideologia de Gênero
3 –
Ativismo LGBT
4 –
Comunismo
5 –
Esquerdismo
6 –
Islamismo”.
Respiro fundo. Organizo os pensamentos e as
emoções. Vamos lá, combater a deturpação das ideias e o ataque rasteiro e
preconceituoso a coisas que nem sequer se conhece...
Não ensinar nada sobre o sexo? E como fica a
gravidez precoce? Falar sobre sexualidade nas escolas, na idade certa,
representa uma orientação segura e responsável para se evitar ou minimizar consequências
desagradáveis, afinal, infelizmente, nem todas as famílias têm condições de bem
conduzir seus filhos neste delicado assunto. Outra pergunta: a sexualidade não
pertence à nossa biologia? Dentro do ensino das Ciências deve haver assunto
proibido?
Ideologia de gênero é uma fantasia criada na
cabeça dos reacionários mais radicais. Oh meu Deus! Alguém ainda acredita em “mamadeira
de piroca” nas creches?
Sobre o “ativismo LGBT”, creio ser preciso
esclarecer que não se trata, em absoluto, de corromper ou influenciar a
sexualidade de quem quer que seja. Entendo ser, simplesmente, um mecanismo para
combater os preconceitos que recaem fortemente sobre os indivíduos que não se
encaixam no padrão “homem/mulher/cisgênero”. Mostrar este preconceito, fazer
com que os jovens aceitem e respeitem as diferenças, quaisquer que sejam, não
seria também uma educação com elevados propósitos de cidadania? Que mal há
nisso?
“Comunismo” e “esquerdismo” são palavras que
foram demonizadas pela ignorância. Mas, enfim, o que é o comunismo? A definição
mais simples que encontrei foi esta: “Uma ideologia política, social e
econômica contrária ao capitalismo, na qual se estabelece uma sociedade
igualitária”. Mais uma pergunta: “Se é aceitável ensinar, nas escolas,
sociologia, filosofia e história, por que não abordar todas as ideologias existentes,
tratando do comunismo, capitalismo, liberalismo, neoliberalismo, imperialismo,
etc?”. É libertador para o aluno conhecer todas as vertentes de pensamento,
para que possa, por fim, formar o seu próprio pensamento.
A presença do termo “islamismo” como algo
negativo e que não deve ser ensinado nas escolas representa o mais alto grau de
preconceito com uma religião como outra qualquer. Aliás, é a segunda maior
população religiosa do mundo, depois dos cristãos. Penso que é extremamente
válido que a escola mostre aos alunos os traços principais das diversas
religiões: cristianismo católico, cristianismo protestante, espiritismo,
umbanda, candomblé, judaísmo, islamismo, hinduísmo, budismo, confucionismo,
xintoísmo, taoismo, vodu, etc. Conhecimento não é pecado, é mostrar ao aluno o
enorme leque composto por vários caminhos, e cada um segue o que quiser depois,
ou nenhum deles, pois o ateísmo também é um caminho válido e que deve ser
respeitado, como qualquer outro.
Não é porque existem maus religiosos, que
misturam as coisas e promovem o terrorismo fundamentado no “radicalismo
islâmico”, que temos o direito de incriminar o islamismo. Não é a religião que
é ruim, são alguns dos seus fiéis que o são. Afinal, o catolicismo também
carrega uma carga muito negativa em sua história, com a santa inquisição e as
cruzadas. De onde se conclui que é preciso separar a religião do religioso. Eu
mesmo, que sou espírita, já me decepcionei bastante com os espíritas, mas não
com o espiritismo.
Finalizando, faço um apelo para você que me lê,
e que chegou até esta conclusão do meu raciocínio, para que não se deixe levar
por preconceitos e correntes de WhatsApp. Família é algo muito importante, e os
primeiros 80% do texto que recebi retratam esta importância sem incorrer em
distorções ou mentiras. No entanto, os 20% restantes empurram os incautos para
o terreno do preconceito e do ataque a conceitos demonizados e nunca explicados
com a clareza que merecem. Fique atento. Não se deixe levar por coisas que lhe fazem
odiar certas coisas. Isto nunca é um bom caminho. Você estará cada vez mais
distante de um pensamento livre e justo.
Recado dado. Afinal, não poderia deixar passar este texto em corrente de WhatsApp sem dar o meu contraponto.
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